A palavra planejamento tem sido corriqueira desde a implantação do Campeonato Brasileiro por pontos corridos, em 2003. Nos últimos cinco anos, a capacidade de prever as dificuldades em um torneio de aproximadamente sete meses é apontada como principal responsável pela conquista dos campeões. Por outro lado, a falta de organização também faz vítimas na parte de baixo da tabela, e, em 2007, ela foi fatal de maneira histórica para o América de Natal.
Depois de se tornar a primeira equipe a subir dentro de campo da Série C para a Série A em dois anos, o clube potiguar viu ruir sua ascensão da pior maneira possível: amargou a última colocação da primeira divisão com apenas 17 pontos em 38 jogos e o rebaixamento decretado a sete rodadas do final da competição.
Mais do que isso, o aproveitamento de 14,91% dos pontos foi o pior das últimas 12 temporadas. Nas 37 edições do Nacional, somente dois times tiveram desempenho pior, quando atuaram, pelo menos, 20 vezes na temporada: o União São João-SP em 1995, com 13,04% de aproveitamento, e o Sergipe em 1972, que conquistou 14,67% dos pontos que disputou. Para completar, as 29 derrotas acumuladas no Brasileirão de 2007 tornam o Mecão a equipe mais perdedora da história da competição em uma edição.
Diante deste cenário negativo, o diagnóstico de vários dos envolvidos põe a culpa no Campeonato Potiguar. Nele, o Dragão liderou a primeira fase do estadual com folga, somando 15 pontos a mais que o time que detinha a segunda melhor campanha, o ABC. As finais com resultado adverso diante do arqui-rival, no entanto, sentenciaram o desempenho do clube por toda temporada.
Após o empate por 1 a 1 na partida de ida, a goleada por 5 a 2 sofrida na volta fez com que o presidente Gustavo Carvalho trocasse a comissão técnica capitaneada por Estevam Soares e boa parte do elenco. Opção que, segundo a maioria, resultou na triste campanha no Brasileiro.
“A perda do campeonato para o ABC gerou uma mudança radical. Nós tomamos de cinco! O presidente Gilberto Carvalho achou que tinha que mudar, talvez não fosse a equipe que ele esperava para a Série A. Quis motivar a torcida e dispensou muita gente”, explica um dos profissionais americanos mais antigos, o médico Maeterlinck Rêgo Mendes, que viu centenas de técnicos irem e virem nos 36 anos em que está no clube. “Em todo esse tempo, nunca tinha visto uma campanha como essa no Brasileiro”.
Contudo, o vice-presidente de assuntos ligados ao futebol, Ricardo Bezerra justifica a estratégia, apesar de admitir o equívoco. “Nós erramos no início do planejamento. No estadual, o América foi o melhor em toda a competição, mas fizemos a avaliação do plantel em campos ruins, duros, pequenos. Fomos bem pela fragilidade dos adversários. Não tínhamos condição de permanecer com a comissão técnica. Apesar de gostarmos do trabalho do Estevam Soares, eles (ABC) estavam na Série C e a gente na A. Qualquer clube é assim. Imagina se o Flamengo perde do Vasco por cinco gols...”, compara.
Porém, as justificativas não servem para um dos que mais sofreram com a opção americana: o técnico Lori Sandri, que iniciou o Brasileiro com a equipe. “O América começou errado. Não houve um preparo com a perda do titulo estadual. Íamos começar o campeonato no dia 13, eu cheguei dia 3 e nem goleiro tinha. Eles contrataram o Renê em São Paulo na quarta, ele assinou no aeroporto e jogou no domingo com oito quilos a mais”, conta o treinador, que encarou os problemas durante toda a preparação para as oito partidas em que esteve à frente do time.
“Na primeira folga, mais ou menos na sexta rodada, fizemos avaliações físicas. Dos 28 jogadores, 26 estavam abaixo do normal. Apenas o Arlon e mais um foram aprovados. Na época, não divulgamos para não criar tumulto. Levamos o caso para a diretoria e vimos que teríamos muita dificuldade”, relata.
Foto Fernando Pilatos/Gazeta Press |
São Paulo comemora o gol que lhe deu o título, enquanto o América-RN só lamenta. Uma cena rotineira dos potiguares. |
Os jogadores também concordam com seus comandantes e culpam as decisões imediatistas tomadas pela diretoria. “O clube vinha de ascendência na Série B, deveria acontecer a permanência de atletas. Nossa equipe é limitada. Se você traz vários a uma semana da competição já dificulta bastante”, condena o meia Leandro Sena, presente nos dois acessos seguidos do América desde 2005.
O goleiro Sérvulo, titular no fim da temporada, foi uma das vítimas desta política. Logo depois do Campeonato Potiguar, não teve o vínculo renovado, mas retornou na semana anterior ao Brasileiro porque não havia arqueiro reserva. “Meu contrato acabou com o estadual e não queriam renovar, mas o Marcelo Bonan, que era titular, se machucou e renovaram”, relembra, lamentando a decisão dos dirigentes na época. “O grupo do estadual era um bom time, estava bem entrosado. Mas a diretoria ficou com raiva”.
Para agravar ainda mais a situação americana, que já figurava na zona de rebaixamento desde a quarta rodada, o rodízio de jogadores continuou, na tentativa de montar um time dentro da competição. Ao todo, 53 atletas entraram em campo com a camisa da equipe pelo Brasileiro, e o clube fecha 2007 com o alarmante número de 47 dispensas durante a temporada. Isso sem contar as quatro comissões técnicas que passaram pela equipe – Paulo Moroni comandou os rubros nos últimos 17 jogos do Nacional.
“Com certeza isso atrapalhou. Quem entende um pouquinho de futebol sabe que é difícil trabalhar assim”, diz Leandro Sena, acompanhado por seus treinadores. “Fizeram uma rotatividade muito grande. Isso não dá segurança para o grupo, nem para o jogador”, emenda Marcelo Veiga. “Se mantivessem a estrutura, com algumas modificações, teriam menos dificuldade no Brasileiro”, completa Lori Sandri.
Entretanto, há quem não condene a dispensa em massa. “Não podemos culpar o presidente. Depois que acontece é fácil dizer, ninguém tomaria essa decisão. Mas tinha que ser tomada uma posição. Se perde uma final de cinco, tem que mudar. Hoje em dia, vemos que isso serviu de exemplo e espero que não aconteça mais”, afirma o supervisor de futebol Carlos Moura Dourado.
E até Leandro Sena isenta os diretores. “Quando a coisa não dá certo, tem que haver mudança. A diretoria buscou de todas as formas, mas isso não foi possível. O futebol é muito complexo. Às vezes, você faz uma coisa sem muito fundamento e dá certo. Às vezes você planeja, se projeta, injeta dinheiro e não dá. Dava tempo para se programar e objetivar a permanência na Série A. Foram cinco meses até começar o Brasileiro. Mas não jogo a culpa na direção, cada setor teve sua parcela de culpa: nós jogadores, as comissões técnicas...”, opina.
http://www.gazetaesportiva.net/reportagem/futebol/2007/rep690.php
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