Com espírito renovado em relação a 2006, seleção brasileira não deve mais resvalar na auto-suficiência. Desta vez, “apenas” os rivais serão obstáculo para o sexto título mundial do Brasil
Falta de preparo e concentração, clima de festa antecipada, auto-suficiência. Algum desses aspectos, tão prejudiciais em 2006, poderá voltar a interromper o sonho do Brasil de se tornar hexacampeão mundial? Em 2010, não. Pelo menos é o que acreditam ex-jogadores, técnicos e jornalistas consultados pelo iG Esporte. Eles não descartam a chance de a seleção voltar da África do Sul de mãos abanando. Mas, caso isso ocorra, não deve ser por falta de foco e preparação.
Perder faz parte do jogo quando se enfrenta rivais como Alemanha, Itália e Argentina. Mas em 2006, na visão dos críticos, o Brasil acabou eliminado da Copa por seus próprios erros. À época, com um time repleto de estrelas – Ronaldo, Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Adriano –, o então campeão mundial, balado fora de campo, não correspondeu dentro dele. E o sonho do penta foi pelo ralo nas quartas-de-final, com um gol do francês Henry.
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Henry festeja vitória sobre o Brasil, com um gol dele, na Copa de 2006 |
Segundo o ex-jogador César Sampaio, a eliminação precoce em 2006 deve ser tomada com um exemplo a não ser seguido. “Há outras seleções muito bem preparadas. O grande momento para o Brasil é agora. Deve-se pensar na Copa passada e trabalhar o emocional, a fim de evitar que se cometam os mesmos erros de antes”, diz o ex-meio-campista, que disputou a Copa de 1998 pela seleção.
Dunga tem feito de tudo para isso. Assumiu o comando da seleção em julho de 2006, com a missão de devolver a competitividade à equipe. Desde então, com base no discurso de respeito e prioridade à camisa canarinho, renovou o elenco, deixando de lado medalhões e apostando em novos nomes para várias posições.
O ex-volante Mauro Silva, companheiro do atual treinador da seleção brasileira na conquista do tetra, em 1994, aposta que o espírito descompromissado de 2006 não se repetirá em 2010. “Conheço o Dunga. Não acho que ele vai aceitar nenhum tipo de relaxamento ou desatenção. Copa é diferente de tudo. E o Dunga vai exigir máxima atenção”, diz. “Certamente, o Dunga vai estar super atento a todos os detalhes.”
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Dunga é visto como "disciplinador" e capaz de manter o time antenado |
Após a chegada do novo treinador, perderam espaço atletas consagrados, mas em fase descendente da carreira, como Cafu, Ronaldo e Roberto Carlos. O atacante Adriano, de quem se esperava muito em 2006, foi uma exceção: chegou a ter seu nome na lista de ameaçados, mas recuperou o cartaz com um excelente desempenho após voltar ao Flamengo, onde conquistou o título brasileiro como artilheiro da competição.
As chances dos outros
Carlos Alberto Torres, capitão da seleção tricampeã mundial em 1970, concorda com a tese de mudança de postura da seleção e acredita que, em campo, o grupo das equipes mais tradicionais, formado por Alemanha, Inglaterra e Itália e reforçado pelos espanhóis, atuais campeões europeus, é que pode tirar o hexa brasileiro: “Esses times, junto com o Brasil, sempre chegam como favoritos”.
O jornalista Alberto Helena Jr., do iG Esporte, alerta para a força dos atuais campeões do mundo. “Apesar de não estar jogando um grande futebol, a Itália é sempre um tormento para o Brasil, porque joga um futebol muito fechado”. Ele também aponta o futebol inglês como uma ameaça: “O time tem um jogador excepcional, o Wayne Rooney, está muito melhor armado do que em outras vezes e tem condições de surpreender.”
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Itália, de De Rossi e Pirlo, é campeã do mundo e tem tradição de sobra |
Quem chega à Copa com um cartel suficiente para desafiar o Brasil, apesar de menor tradição em Copas, é a Espanha. Campeã da Eurocopa 2008, a Fúria conta com um time experiente e de grande qualidade. Mas precisará vencer o estigma de uma seleção que costuma “amarelar” em decisões – o que se confirmou na Copa das Confederações 2009, quando chegou como favorita e acabou caindo na semifinal, contra os Estados Unidos.
Os espanhois contarão com a força do elenco mais caro do mundo, cotado a 565 milhões de euros, segundo o site Futebol Finance. Nomes como Fernando Torres (Liverpool), Villa (Valencia), além de Xavi e Iniesta, ambos do Barcelona e presentes entre os cinco finalistas do prêmio de melhor do mundo da Fifa de 2009, mostram o poderio técnico de um time que, em geral, não chega entre os favoritos aos Mundiais.
Grandes que não assustam
Momentos diferentes dos espanhóis vivem hoje franceses, portugueses e argentinos. Apesar da tradição com que contam, as duas equipes européias penaram para se classificar nas Eliminatórias Europeias — passaram na repescagem, a França graças a um gol irregular —, assim como os hermanos sofreram no torneio sul-americano.
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Argentina, de Maradona e Messi, não vive bom momento |
“A Argentina de hoje tem um grande material humano, mas me parece que o Maradona não consegue conjugar essa turma. E a defesa é muito ruim”, afirma Alberto Helena Jr.
Se hoje Argentina, França e Portugal não assustam tanto, também está claro que a força de equipes como Itália, Alemanha, Inglaterra e Espanha não pode ser ignorada. Mas, tudo isso à parte, em relação a 2006, as chances do hexa brasileiro parecem ter crescido por questões unicamente internas, alheias aos seus rivais.